O Tropeirismo e a Formação do Brasil
clique na imagem para ampliá-la
A dificuldade que representa estabelecer-se um sistema de transportes, eficiente e econômico, em região de difícil acesso e tão irregularmente ocupada, levará à procura de meio de transporte que possa solucionar o problema. Avulta então o ciclo do tropeirismo que vem a resolver a questão.
Apesar dos obstáculos, pode-se dizer que a partir de 1730 ou mesmo antes disso, teve início a exportação de animais, do extremo Sul para as regiões centrais. Desde então, grande número de cabeças de gado, arrebanhadas nas planícies do Sul, chegam às terras de São Paulo, e logo, se distribuem para outras regiões, depois de negociadas nas célebres feiras anuais de Sorocaba.
A tropa xucra era constituída pelos animais adquiridos no sul e trazidos soltos, pelos tropeiros. Esses animais seguiam instintivamente o animal guia colocado à frente, a égua madrinha, o que facilitava o trabalho dos peões.
Além de agente por excelência do comércio, o tropeiro tornou-se indispensável em outras atividades. Era o emissário oficial, o correio, o transmissor de notícias, o intermediário de negócios, o portador de bilhetes, recados, encomendas e receitas.
Altamente considerado pelos principais figuras dos lugares onde negociava, o tropeiro era sempre bem recebido nas casas senhoriais e eram-lhe conferidas as mais importantes missões pela confiança que inspirava e conquistava onde quer que passasse. Eram reconhecidos não só como homens corajosos e experientes, preparados para solucionar os imprevistos das viagens, como probos e honrados nos negócios. O seu prestígio econômico e social acabava por lhe abrir as portas da política.
Apesar da vida rude que levavam, quando encontravam-se em Sorocaba, por ocasião da feira anual de animais [...] o dinheiro era farto pelo menos durante três meses de cada ano, de março a maio, os tropeiros exibiam uma ostentação e esbanjamento demonstrado no rico ajaezado de suas montarias e gastos excessivos no jogo, nas libações, nas festas.
O tipo social por excelência desse período – o tropeiro – era necessariamente um chefe de bando armado.
A Estrada da Serra abria verdadeiramente o ciclo do tropeirismo brasileiro, viabilizando, apesar de seu percurso árduo e rústico, a retirada anual de milhares de cabeças.clique na imagem para ampliá-la
Para arrebanhar as tropas e afastá-las das querências, a faina com os muares é mais trabalhosa que a do gado [...] Esse movimento que começava na madrugada alta, ao fim do dia se interrompe no pouso, com os peões totalmente esgotados. No entanto, os peões, alternadamente, passavam a noite caminhando ou troteando ao redor da tropa desinquieta e arisca. Enquanto uns dormiam ao relento, sobre pelegos, outros faziam a ronda, na chuva ou no rio.
A caça era muito praticada entre os tropeiros, e nela não se perdoavam as aves como papagaio e outros pequenos animais. A morte de um tamanduá bandeira significava festa por alguns dias.
Os ranchos para o pouso noturno eram péssimos e os paióis na maioria das vezes encontravam-se estragados com cobertura de sapé arrebentada, sem paredes laterais, onde passavam mal os viajantes para enfrentar a friagem noturna, vencida com inúmeras fogueiras.
Outra lenda, trazida do sul pelos tropeiros gaúchos, é a do Negrinho do Pastoreio, presente em vários pontos da zona rural que circunda Sorocaba. O Negrinho era o duende o que socorriam os tropeiros para encontrar um animal desgarrado. Para solicitar a sua presença e ajuda bastaria acender o toco de uma vela junto a uma porteira do campo.
Ainda no século 19, em plena monarquia, foram feitos os primeiros investimentos de vulto na instalação de ferrovias e estradas carroçáveis no Brasil. Contudo, a modernização dos transportes só viria a ser uma característica da economia brasileira no nosso século. Os estudiosos do tropeirismo tem atribuído o declínio e extinção do ciclo, ocorrido na década de 30, ao deslocamento ou perda do uso do muar no sistema de transportes de carga, hoje feito principalmente por caminhões.
FRIOLI, Adolfo; BONADIO, Geraldo. O tropeirismo e a formação do Brasil. Sorocaba [SP] : Academia Sorocabana de Letras : Fundação Ubaldino do Amaral, 1984. 47p, il. (Cadernos da Academia Sorocabana de Letras).
Jonathas Kistner - Grupo de Estudos Manoa
Comentários